terça-feira, 23 de agosto de 2016

"SUBSÍDIO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL". ALGUMAS NOTAS SOBRE A NOVA LEGISLAÇÃO

Foi hoje publicado o Decreto Regulamentar n.º 3/2016 que regulamenta a atribuição do “subsídio de educação especial a crianças e jovens até aos 24 anos.
É atribuído a crianças e jovens que "possuam comprovada redução permanente de capacidade
física, motora, orgânica, sensorial ou intelectual, doravante designados por «criança ou jovem com deficiência»", que se encontrem em qualquer destas situações:
a) Frequentem estabelecimentos de educação especial que impliquem o pagamento de mensalidade;
b) Careçam de ingressar em estabelecimento particular ou cooperativo de ensino regular, após a frequência de ensino especial, por não poderem ou deverem transitar para estabelecimentos públicos de ensino ou, tendo transitado, necessitem de apoio individual por técnico especializado;
c) Tenham uma deficiência que, embora não exigindo, por si, ensino especial, requeira apoio individual por técnico especializado;
d) Frequentem creche ou jardim -de -infância regular como meio específico necessário de superar a deficiência e obter mais rapidamente a integração social.
Sem prejuízo de uma leitura mais profundada surgiram-se duas ou três questões que partilho.
O normativo procura estabelecer o processo e competências que possibilitem o acesso ao “subsídio de educação especial”.
No entanto, não consegui perceber no caso da situação da alínea a) “frequência de estabelecimentos de educação especial” como será este processo. É uma opção das famílias? É uma prescrição de um “técnico especializado” ou de um “médico especialista”. Qual o papel dos estabelecimentos de ensino regular e das respectivas estruturas de direcção pedagógica e de educação especial nesta decisão?
Esta minha dúvida coloca uma questão essencial, o enorme risco de retorno à resposta educativa institucionalizada logo desde o início da escolaridade obrigatória.
O processo de atribuição do subsídio para “apoios especializados” é definido com alguma clareza embora, do meu ponto de vista, excessivamente centrado no “médico especialista” (em muitas situações não sei muito bem que tipo de “especialidade” será solicitada) quando está em discussão a definição de apoios que parecem ser  … “educativos”, embora se abra a hipótese de avaliações por parte de “equipas multidisciplinares de avaliação médico-pedagógica, constituídas nos termos a definir em regulamentação própria”.
Neste âmbito sublinho a intenção de prevenir algumas “tentações”, por assim dizer, não permitindo que o apoio seja realizado pelo “médico” especialista que comprovou a ”redução permanente da capacidade física, motora, orgânica, sensorial ou intelectual” nem por uma clínica em este “médico especialista” tenha uma “relação laboral” ou “participação societária”.
Em síntese, creio que o Decreto Regulamentar n.º 3/2016 vem dar uma ajuda aos estabelecimentos de educação especial,  e acentua uma visão e um modelo de natureza clínica que há muito tínhamos tentado minimizar por se tratar de processos educativos. Não está em causa, evidentemente, as situações claras de necessidades de resposta do âmbito da medicina, mas estamos a falar da atribuição de um “subsídio de educação especial”.
Era desejável uma mudança legislativa neste universo mas creio que a mudança conhecida é num caminho que não promove e defende a educação inclusiva até ao limite do possível e, por outro lado, fragiliza seriamente a tutela de processos de natureza educativa por parte de estruturas e técnicos com competência neste universo, sobretudo após o início da escolaridade obrigatória.
Nos últimos anos, pelo menos nos preâmbulos de legislação nesta área, educação e apoios a crianças e jovens com deficiência, ainda se falava de “educação inclusiva”, agora nem isso.
Assim, terão, esperemos, os apoios especializados, necessários evidentemente para muitas crianças e jovens, e podem frequentar as instituições de educação especial logo partir dos seis anos.
Não estranharão quando chegarem aos dezoito.
Como nota final e para clarificar, as instituições especializadas têm com certeza um conjunto de competências importantes mas, do meu ponto de vista, colocadas ao serviço de um trajecto de educação inclusiva o que com com este quadro legislativo não me parece claro.

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