sábado, 17 de janeiro de 2015

PISAR O RISCO

Vários dos acontecimentos dos últimos tempos levaram-me a recordar, a trama de que se tece a memória é muito curiosa, uma das expressões que em miúdo mais ouvia ao meu pai, “pisar o risco”.
Empregava-a com frequência, em diferentes circunstâncias e dirigida a mim ou empregue para apreciações a comportamentos ou atitudes de outras pessoas. Percebi com o tempo que era uma expressão de uso vulgar, não exclusiva do meu pai.
Com a fórmula do “pisar o risco” procurava, sobretudo comigo, que percebesse a necessidade do “risco”, hoje é mais comum chamar regras, e como, sabendo qual era o risco, perceber se deveria, ou não, ser pisado, e as consequências que eventualmente adviriam de “pisar o risco”.
Neste contexto, cresci como todos, quase, da minha geração, a tentar evitar “pisar alguns riscos”, umas vezes com sucesso outras nem por isso, e a decidir, com toda a intenção, que havia riscos que era preciso pisar.
Hoje, sem parecer demasiado pessimista, quando olho à volta, fico com a sensação que a gente pisa, mas já não tem muita noção de qual é o risco e onde está. Atropelamo-nos diariamente nas relações sociais e profissionais e na vida em comunidade, assistimos a comportamentos completamente despudorados de gente que não deveria “pisar o risco” até pelo peso social que tem. Pisamos o risco em matéria de valores, ética e dignidade. Embora saiba que não é fácil definir qual é o "risco", talvez a disponibilidade para perceber o ponto de vista do outro ajude.
Os mais novos, muitos, andam perdidos sem a noção de que pisam o risco, ou pisam o risco com intenção mas agarrados à ideia de que a vida está no “pisar o risco”.
Os direitos das pessoas, risco que nunca poderia ser pisado, são esquecidos com frequência, etc.
No entanto, como sempre, há riscos que continuam a precisar de ser pisados. Mudam de forma, mas não mudam de conteúdo.

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