sexta-feira, 25 de julho de 2014

OS VELHOS PROBLEMAS DAS VELHAS PRAXES.

"Inquérito à tragédia do Meco dá razão à tese de acidente"

A tragédia da praia do Meco terá conhecido, a ver vamos, o seu epílogo. Foi acidente pois a investigação não imputa qualquer responsabilidade criminal ao sobrevivente.
Esta decisão estava anunciada desde o início. Dificilmente poderia ser provado outro qualquer cenário. Funciona assim como acontece com frequência com os Códigos de Praxe e os Tribunais de Praxe, ou seja, existem mas servem para pouco.
No entanto, do meu ponto de vista, independentemente das reacções emotivas das famílias que procuram um “alvo” que lhes ajude a atenuar uma dor imensa e eterna, a questão continua nos mesmos termos, aquele grupo reuniu-se num contexto relacionado com as actividades de praxe e era constituído por gente responsável por essas actividades em vários dos cursos da Lusófona.
Daqui a pouco tempo vai iniciar-se um novo lectivo como mais uns milhares de caloiros, “bestas” como lhes chamam nas elegantes praxes académicas, pelo que vale pena ter bem presente esta tragédia e reflectir sobre este universo. Assim, retomo umas notas antigas.
“Como muitas vezes já aqui afirmei partindo de um conhecimento razoavelmente próximo deste universo, a regulação séria dos comportamentos nas praxes, se elas existirem, parece-me absolutamente indispensável. Parece-me ainda importante que os dispositivos de  regulação das praxes integrem o respeito por posições diferentes por parte dos estudantes sem que daí advenham consequências implícitas ou explícitas para a sua participação na vida académica que, frequentemente, não sendo "enunciadas", são, evidentemente, praticadas como toda gente que conhece o meio bem sabe. Estamos a falar de gente crescida e, espera-se, autodeterminada, seja numa posição favorável ou desfavorável. Os repetidamente referidos "Códigos de Praxe", nas suas diferentes designações, não parecem suficientes para inibir abusos dos comportamentos e as consequências negativas sobre os não aderentes às praxes.
Na verdade, de forma aparentemente tranquila coexistem genuínas intenções de convivialidade, tradição e vida académica com boçalidade, humilhação e violência sobre o outro, no caso o caloiro. Tenho assistido a cenas absolutamente deploráveis por mais que os envolvidos lhes encontrem virtudes.
Apesar dos discursos dos seus defensores, continuo a não conseguir entender como é que, a título de exemplo, humilhar rima com integrar, insultar rima com ajudar, boçalidade rima com universidade, abusar rima com brincar, ofender rima com acolher, violência rima com inteligência ou coacção rima com tradição. Devo, no entanto sublinhar que não simpatizo com estratégias de natureza proibicionista, sobretudo em matérias que claramente envolvem valores. Nesta perspectiva, parece-me um passo positivo uma anunciada iniciativa de regulação envolvendo diferentes academias.
Quando me refiro a esta questão, surgem naturalmente comentários de pessoas que passaram por experiências de praxe que não entendem como negativas, antes pelo contrário, afirmam-nas como algo de positivo na vida universitária. Acredito e obviamente não discuto as experiências individuais, falo do que assisto.
A minha experiência universitária, dada a época, as praxes tinham entrado em licença sabática, por assim dizer, foi a de alguém desintegrado, isolado, descurriculado, dessocializado e taciturno porque não acedeu ao privilégio e experiência sem igual de ser praxado ou praxar. Provavelmente, advém daí a minha reserva.”

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