sábado, 19 de abril de 2014

NÃO. DEFINITIVAMENTE, NÃO SOMOS UM PAÍS DE DOUTORES

"Há menos estudantes do secundário a querer tirar um curso superior"


O preocupante abaixamento do número de alunos que terminado o 12º ano pretende continuar a estudar parece ter como causa mais provável as dificuldades económicas das famílias que também explica o abandono de muitos alunos já durante a frequência do curso.
No entanto, temo que o número relativamente baixo de alunos com a intenção de adquirir formação de nível superior possa também estar ligado à perversa e errada ideia do “país de doutores” que, muitas vezes com o auxílio de uma imprensa preguiçosa e negligente, se foi instalando a propósito do número de jovens licenciados no desemprego e da conclusão de que “não vale a pena estudar”, um verdadeiro tiro no pé e que não corresponde de todo à verdade. Desculpem a insistência mas é preciso.
Em primeiro lugar, os jovens licenciados não estão no desemprego por serem licenciados, estão no desemprego porque temos um mercado pouco desenvolvido e ainda insuficientemente exigente de mão-de-obra qualificada e muitos estão no desemprego porque, por desresponsabilização da tutela, a oferta de formação do ensino superior é completamente enviesada distorcendo o equilíbrio entre a oferta e a procura.
A qualificação profissional, de nível superior ou não, é essencial, continuamos com taxas de formação superior abaixo das médias europeias, como também é essencial a racionalidade e regulação da oferta do ensino superior e, naturalmente, a regulação eficaz do mercado de trabalho minimizando o abuso do recurso à precariedade. É ainda de sublinhar que conforme um estudo recente, "Empregabilidade e Ensino Superior em Portugal", da responsabilidade da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior a qualificação de nível superior compensa em termos de estatuto salarial e empregabilidade, como aliás estudos internacionais, por exemplo da OCDE, também demonstram. Embora como recentemente foi divulgado os vencimentos médios estejam em quebra a situação ainda se verifica.
Por outro lado, parece oportuno recordar que, de acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, Portugal é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia (UE) 23,6%.
Esta informação não é nova. Na verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o ensino superior, Portugal, contrariamente ao que muitos afirmam, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de 2011/2012 da rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na Europa, mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, temos na prática o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Em 2012 foi divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa, Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a formação superior. Neste cenário, o número de desistências da frequência tem vindo a aumentar pois muitos alunos ou famílias não suportam os encargos com o estudo. Sabe-se também dos constrangimentos na atribuição de bolsas de estudo.
Como sempre que abordo estas matérias, finalizo com a necessidade de, uma vez por todas, evitar o discurso "populista" do país de doutores, continuamos com uma enorme probabilidade não cumprir a meta europeia para 2020 de 40% de licenciados no escalão etário 30-34 anos.

Sem comentários: