domingo, 12 de janeiro de 2014

O ENSINO SUPERIOR, O MERCADO DE TRABALHO E O FINANCIAMENTO

No Público encontra-se uma interessante entrevista com Devon Jensen, professor universitário com trabalho desenvolvido sobre o papel das universidades, a sua relação com os governos e o mundo económico e empresarial, que apresentou em Lisboa uma conferência com a estimulante interrogação como título, Is Higher Education Merely a Servant of the Economy?  .
Da extensa entrevista cuja leitura se recomenda relevam alguns aspectos interessantes que refiro brevemente.
Uma primeira nota para sublinhar a atribuição de importância crucial nos tempos actuais do investimento em formação de nível superior ainda que em diferentes formatos e extensão. Esta afirmação contraria a lógica actualmente seguida em Portugal de desinvestimento no ensino superior e investigação.
Parece-me também de sublinhar a importância do investimento na formação e desenvolvimento na formação e investigação nos domínios das ciências sociais e das humanidades. Mais uma vez, este investimento e importância são afirmados ao arrepio da forma insustentável como em Portugal as Ciências Sociais e das Humanidades são consideradas pelo MEC como várias posições e discursos ultimamente produzidos e divulgados demonstram e aos quais aqui tenho feito referência.
No mesmo sentido parece interessante que, contrariando um discurso que se instala no sentido de definir a oferta formativa de ensino superior com um critério quase exclusivamente centrado na “empregabilidade”, Devon Jensen chama a atenção para a volatilidade e mudança no mercado de trabalho, bem como para o papel de liderança que as instituições devem assumir na definição da sua oferta, ou seja e como já tenho referido, o ensino superior não deve ignorar o marcado de trabalho mas não pode andar “a reboque” desse mercado que, aliás, muda a uma velocidade enorme.
Uma última referência para o que Devon Jensen chama de “novo paradigma” no financiamento das universidades.
Em termos simples, Devon Jensen afirma que sendo as empresas beneficiárias da qualificação dos seus trabalhadores devem, por isso, financiar as universidades para a formação. A experiência vai-me causando alguma reserva face aos “novos paradigmas” tantas vezes referidos a propósito das mais variadas matérias que, nas mais das vezes, de novo têm pouco e paradigma … nunca serão.
Na verdade esta perspectiva levanta-me algumas questões. Em primeiro lugar, creio que se considerarmos que as empresas beneficiam da qualificação superior dos seus colaboradores então devem pagar-lhes em função dessas competências e dos benefícios que obtêm. Com salários mais elevados os mais qualificados pagarão, obviamente, um maior volume de impostos o que contribui mais para o financiamento do estado e, também, do ensino superior público. A situação por cá é assustadora pois verifica-se que empresas e também o estado pagam a pessoas qualificadas salários miseráveis e indignos, não sendo um salário mas antes um subsídio de sobrevivência. Como esperar que este mercado que assim funciona venha a envolver-se num “novo paradigma” financiando o ensino superior?
Finalmente, com as empresas a financiar o ensino superior, creio que se acentuaria a desvalorização do universo das ciências sociais e das humanidades. O que se passa com alguns financiamentos à investigação mostram isso mesmo.
No entanto, creio que a entrevista de Devon Jensen merece reflexão.

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