quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

ESTA GENTE VAI VIVER DE QUÊ?

É difícil ficar imune às sucessivas notícias sobre os problemas que atravessamos pelo que com muita frequência aqui retomo algumas questões. Eu sei que não adianta falar muito delas porque não se resolvem assim, mas também penso que não é fácil não as abordarmos, por isso, insisto.
Os dados do desemprego voltam a subir e o Primeiro-ministro admite que assim continuem, a taxa está agora em 16,9% perto de um milhão de portugueses oficialmente registados mas cerca de milhão e meio sem emprego.
Há semanas noticiava-se a existência de 483 000 pessoas desempregadas há mais de um ano. Esta tragédia envolve sobretudo pessoas de meia idade e muitos jovens e as referências acentuam as dificuldades e falta de confiança das pessoas na alteração na situação.
O desemprego é reconhecidamente o mais devastador efeito das dificuldades que atravessamos.
Por outro lado, existem cerca de 285 000 pessoas com o RSI, número que tem vindo a baixar regularmente.
Recordo ainda que também há poucas semanas, segundo dados disponíveis do INE e da Segurança Social, cerca de 465 000 desempregados, 56 %, não tinham protecção social há nove meses. Este número, que na realidade será mais alto, é absolutamente devastador e dramático, representando o mais alto valor alguma vez atingido de pessoas em situação de desprotecção social.
O problema vai, provavelmente agravar-se, pois naquilo que alguns estão a considerar a reforma do estado se prevê o corte nas políticas sociais.
Mesmo entre pessoas com trabalho, existem cerca de 153 000 portugueses que recebem menos de 310 € de salário líquido e cada mais gente com o salário mínimo.
A este cenário acresce, ainda de acordo com o IEFP, que, no último ano, o número de casais com ambos os elementos no desemprego mais do que duplicou e o valor médio dos subsídios de desemprego tem vindo a baixar.
Há tempos foram divulgados alguns dados referindo que cerca de 200 000 pessoas já terão desistido de procurar emprego, não constando sequer dos números do desemprego. Este quadro impressionante levanta uma terrível e angustiante questão. Os milhares, muitos, de pessoas envolvidas vão (sobre)viver de quê?
Sendo de esperar a continuação de um período recessivo e, portanto, sem crescimento, torna-se impossível criar a riqueza necessária e redistribuí-la de forma socialmente mais justa para minimizar esta tragédia.
É certo que em Portugal a chamada economia paralela corresponde a cerca de 25% do PIB e muita gente e muitas actividades estão envolvidas neste universo, de qualquer forma o potencial impacto social destes números é, no mínimo, inquietante.
Afirmo com frequência que uma das consequências menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que mais de dois milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra. Na verdade, apesar da retórica oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente insustentável é que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza. Mais preocupante a insensibilidade da persistência neste caminho.
Quando nos dizem que não há alternativa, é interessante registar que alguns analistas, incluindo ironicamente o próprio FMI, atribuem a rápida recuperação da Islândia à manutenção do estado social e dos apoios sociais, ou seja, privilegiou-se as pessoas e não os mercados, a banca, o contrário do diktat que nos é imposto.
A pobreza e a exclusão deveriam envergonhar-nos a todos, a começar por quem lidera, representam o maior falhanço das sociedades actuais. 

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