terça-feira, 25 de dezembro de 2012

GOSTAVA DE TER OUVIDO UMA MENSAGEM DE NATAL

O Primeiro-ministro entregou-nos, conforme a tradição, a sua homilia de Natal. Também conforme a tradição, o Primeiro-ministro falou de um país que nós não conhecemos, um país onde "todos foram e continuarão a ser chamados a participar" no "esforço nacional" e em que "todos beneficiarão das novas oportunidades". Convenhamos que um milhão de desempregados e quase três milhões de pessoas em risco de pobreza participam de forma particularmente empenhada no esforço nacional. Também é fácil perceber os mais imediatos beneficiados com as novas oportunidades, basta atentar no andamento dos negócios da relvatização, perdão, da privatização em que se vai vendendo o país.
Este Natal foi o Natal mais frio de que me lembro, aliás, estamos no fim do ano mais frio de que me lembro. Na sequência do que já tinha vindo a acontecer em anos anteriores abateu-se sobre a grande maioria de nós um inferno que nos deixa perplexos, perdidos de desesperança, numa espécie de anestesia que alguns, erradamente, confundem com resignação.
Chegamos ao fim de 2012 com cerca de um milhão de desempregados, tragédia que afecta mais de um terço dos nossos jovens e muitos, muitos milhares de famílias. Acresce que mais de metade dos desempregados não auferem subsídio e aguardam ansiosamente pelas novas oportunidades, expressão mal escolhida, anunciadas por Passos Coelho.
Acabamos o ano com muitas dezenas de milhares de pequenas empresas falidas cujo "participação" no "esforço nacional" teve consequências nos números do desemprego.
Durante o ano de 2012 fomos assistindo a uma devastadora política de austeridade e corte nos rendimentos que produz pobreza, mesmo entre a população que mantém o luxo de um emprego e que claro vai beneficiar das novas oportunidades de continuar a pagar impostos para além do sustentável.
Fomos ouvindo durante o ano sucessivos alertas de todos os quadrantes sociais e políticos sobre as consequências devastadoras das opções políticas de que nos querem convencer não haver alternativas. Existem alternativas, uma política que produz miséria e exclusão tem que ter alternativas. A mensagem de Natal do Primeiro-ministro evidencia, para não variar, a persistência insensível e insensata neste caminho.
O ano foi também trazendo gravíssimas necessidades de milhares de pessoas que batem desesperadamente à porta das instituições de solidariedade social, já sem o pudor da "pobreza envergonhada", na busca do aconchego de uma refeição ou de um tecto e ao mesmo tempo aos discursos de importância das instituições para responder a todos os apelos. Foi justamente esta gente que foi chamada a participar no "esforço nacional" e com um preço altíssimo.
O ano de 2012 trouxe-nos a inaceitável situação dos miúdos, milhares de miúdos que chegam à escola com fome. Esta gente mais pequena também foi chamada a participar no esforço nacional numa duríssima aprendizagem de cidadania.
Estes tempos trouxeram para a agenda, pelos piores motivos, as discussões sobre caridade, solidariedade social, assistência, estado social, direitos humanos. Uma discussão cheia de equívocos e de gente responsável a afirmar e a promover o inaceitável e demitida do que se espera de quem governa.
Sucederam-se apelos, à doação, à solidariedade dos portugueses, a Segurança Social, o Governo, retoma e aumenta as cantinas sociais, estrutura um programa para proporcionar pequeno-almoço e refeições nas escolas aos milhares de crianças sinalizadas como "carenciadas" e apela às empresas para que alimentem estes miúdos. Simultaneamente, vai promovendo cortes e anunciando novas medidas de diminuição nos apoios sociais que podem minimizar o drama de muitas famílias.
Enfim, tudo circunstâncias que transformam, como disse, este Natal no Natal mais frio dos últimos anos.
Uma última nota, gostava de ter ouvido uma mensagem de Natal por parte do Primeiro-ministro.

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