segunda-feira, 14 de maio de 2012

O SOL NASCE PARA TODOS, A AUSTERIDADE NÃO

Num texto de ontem abordei algo que designei por aspectos psicológicos envolvidos nas dificuldades que atravessamos e que têm importância significativa na vida das pessoas e na sua percepção do mundo que os rodeia.
O Público de hoje apresenta um trabalho que, para além da leitura óbvia em termos de economia e mercado, tem um lado simbólico de extrema importância.
Em 2011, o ano em que o tsunami da austeridade se abateu sobre as famílias, os salários dos presidentes da empresas cotadas, o chamado PSI-20, subiram 5.3 % enquanto a média salarial dos trabalhadores baixou quase 11 %. O vencimento médio dos presidentes é 44 vezes superior ao salário médio dos trabalhadores. Como termo de comparação, em Espanha este valor é 24,7 %.
Eu sei, sou estúpido, que é a economia, mas este cenário não pode deixar de ter um enorme valor simbólico face à retórica sempre presente da equilibrada repartição de sacrifícios, da equidade na austeridade que, como é óbvio, é falsa.
Relembro um estudo da Comissão Europeia, de final de 2011, que analisou a distribuição dos efeitos dos programas de austeridade os países que experimentam maiores dificuldades, Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido.
Segundo o relatório, Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", traduzindo, os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Pode ainda ler-se que nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Portugal é ainda de acordo com o estudo o único país analisado em que "a percentagem do corte (devido às medidas de austeridade) é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
É evidente que não existe equidade na repartição dos sacrifícios. Para além de contrariar o discurso oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que a notícia tem de mais preocupante é a constatação de que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza.
Também sei, sabemos todos, que os mercados não têm alma nem ética mas a liderança que transforma é uma liderança com responsabilidade social e com sentido ético. Não basta proclamar equidade e justiça, é preciso promovê-las.

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