quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A CRISE DAS CRISES

Ao mesmo tempo que milhões de portugueses atravessam sérias dificuldades para assegurarem padrões de qualidade de vida básicos, a imprensa continua diariamente a mostrar um outro lado da crise a que recorrentemente aqui me refiro e cujos efeitos não se tornam facilmente quantificáveis mas são certamente devastadores, a crise de valores e de ética ao nível das lideranças políticas e económicas. Só como exemplos temos referências a fraudes e fuga ao fisco por parte de uma das maiores, senão a maior, empresa portuguesa do seu sector, a Mota-Engil, o envolvimento no mesmo processo do Comendador Berardo, o Mecenas, a distribuição antecipada de dividendos por parte da PT para fugir à nova taxa que irá entrar em vigor, à acumulação de pensões e vencimentos que parece finalmente em vias de limitação, os contornos e a impunidade que o processo Face Oculta continua a revelar, etc.
Sei bem que referências a estas questões num espaço desta natureza, ainda que recorrentes, são irrelevantes. No entanto, também acredito que é necessário reflectir e insistir em discursos e em posições que permitam pressionar no sentido da mudança, daí a insistência em notas que já tenho abordado e a que chamo a pegada ética.
O despertar das consciências para as questões do ambiente e da qualidade de vida colocou na agenda a questão das pegadas, das marcas, que imprimimos no mundo através dos nossos comportamentos. Este novo sentido dado às pegadas tornou secundárias e ultrapassadas as míticas pegadas dos dinossauros e as românticas pegadas que os pares de namorados deixam na areia da praia.
Fomo-nos habituando a ouvir referências às várias pegadas que produzimos com nomes e sentidos mais próximos ou mais distantes mas, sobretudo, tem-se acentuado a grande preocupação com a diminuição do peso, isto é, do impacto das nossas pegadas. Conhecemos a pegada ecológica numa perspectiva mais global ou, em entendimentos mais direccionados, a pegada hídrica, a pegada energética, a pegada verde, a pegada do papel, a pegada do carbono, etc.
Do meu ponto de vista e sempre preocupado com o ambiente, com a qualidade de vida e com a herança que deixaremos a quem nos segue, nunca encontro referências e muito menos inquietações sérias com a pegada ética, isso mesmo, a pegada ética. Os comportamentos e valores que genericamente mobilizamos têm, obviamente, uma consequência na qualidade ética da nossa vida que não é despicienda. Os maus-tratos e negligência que dedicamos aos princípios éticos mais substantivos provocam um empobrecimento e degradação do ambiente e da qualidade de vida das quais cada vez parece mais difícil recuperar.
As lideranças, hipotecando a sua condição de promotores de mudanças positivas são fortemente responsáveis pelo peso e impacto que esta pegada ética está a assumir.
Vai sendo tempo de incluir a pegada ética no universo da luta pelo ambiente, pela qualidade de vida e pelo futuro.

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